sexta-feira, 27 de maio de 2011

Um gesto de carinho!

A seguir uma homenagem que uma grande amiga do meu pai fez para ele em seu aniversário.
Muito obrigada Dinoan, todos nós ficamos muito felizes e emocionados com tudo que disse.


Madianita




Para meu Mestre Professor Fidêncio.


Nasce-se sempre e a cada vez que se


permite o encontro com o inesperado.


Kátia Rose


Fui sua aluna, colega e companheira de trabalho, e continuo amiga.


Ensinar, transmitir todos nós tentamos passar para o outro. O que faz a coisa diferente é a maneira e essa maneira de fazer é o que difere o professor do educador, do mestre.


O que posso falar sobre o adulto/menino Fidêncio Bogo que nasceu há 80 anos e tem o gosto de viver de uma criança de 8 anos?


Fidêncio é o adulto responsável, trabalhador, correto, sério, comprometido, capaz, competente, traz Deus no seu coração, não é por ir a igreja e rezar e sim pela postura grandiosa diante dos seres humanos.


Professor sábio que nos deixava à vontade, diante do erros e das falhas, ajudava os alunos a encontrá-los, resolvê-los com uma simplicidade que nunca nos sentimos diminuídos, ao contrário a grandeza era de um luzeiro que atingia a todos que procuram o saber. Não nos ensinou apenas as declinações latinas, os diálogos em francês, Sócrates, Aristóteles, Santo Agostinho e outros..., mostrou-nos os caminhos que poderíamos seguir.


O carinho com os alunos era tão grande e dos alunos para com ele que até hoje quando se encontra algum colega da faculdade vem logo a pergunta; e o Professor Fidêncio?


O colega de trabalho sensível que percebeu que uma prestação de contas não me fazia feliz, então convidou-me para trabalhar ao seu lado, embora no departamento da hoje Diretoria de Ensino de Porto Nacional não


aceitasse pessoas não graduadas, eu, uma iniciante fui acompanhar o professor diretor da faculdade em seus trabalhos e tratada como uma igual.


Quando escrevia os poemas, os mostrava e pedia opinião sobre os mesmos para nós.


Colega de trabalho fazia análise, estudava as leis da educação, mas o problema do aluno vinha em 1º lugar. Entre os vários projetos construídos o Cuca foi o preferido do Fidêncio. A segurança que todos nós sentimos com a sua presença é imensa. O CEE-TO muda o seu colorido quando hoje ele vem nos visitar; sorrisos se alargam Há braços, é Há do verbo haver mesmo.


É muito amado pela sua família, sempre se refere a ela como os seus presentes, contado o amor o que sabemos que é verdade. A retribuição vem através do amor da esposa, filhas, genros, netos e outros familiares.


Hoje é o seu aniversário sinto-me presenteada pela oportunidade de expor com palavras tão simples escritas para um poeta de 5ª grandeza.


Você, meu querido professor, vivencia o que Mandela falou ao fazer 89 anos: a promoção da coragem onde há medo, do acordo onde existe conflito e esperança, onde há desespero, aprendeu bem esta lição de amor.


Por tudo isso, nunca existirá em sua vida velhice triste, porque é muito amado. O seu coração não encolheu com o tempo, ao contrário, ampliou-se chegando até nós.


Muito Obrigada! Parabéns!


Professor Fidêncio,


Um Abraço.


Maria Dinoan Soares Viana

Palmas, 12 de maio de 2011.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Conto: "Nóis Mudemo"

O ônibus da Transbrasiliana deslizava manso pela Belém-Brasília rumo ao Porto Nacional.

Era abril, mês das derradeiras chuvas. No céu, uma luazona enorme pra namorado nenhum botar defeito. Sob o luar generoso, o cerrado verdejante era um presépio, todo poesia e misticismo.

As aulas tinham começado numa segunda-feira. Escola de periferia, classes heterogêneas, retardatários. Entre eles, uma criança crescida, quase um rapaz.

- Por que você faltou esses dias todos?
- É que nóis mudemo onti, fessora. Nóis veio da fazenda.
Risadinhas da turma.
- Não se diz “nóis mudemo” menino! A gente deve dizer: nós mudamos, tá?
- Tá fessora!
No recreio as chacotas dos colegas: Oi, nóis mudemo! Até amanhã, nóis mudemo!
No dia seguinte, a mesma coisa: risadinhas, cochichos, gozações.
- Pai, não vô mais pra escola!
- Oxente! Módi quê?
Ouvida a história, o pai coçou a cabeça e disse:
- Meu fio, num deixa a escola por uma bobagem dessa! Não liga pras gozações da mininada!
Logo eles esquece.
Não esqueceram.
Na quarta-feira, dei pela falta do menino. Ele não apareceu no resto da semana, nem na segunda-feira seguinte. Aí me dei conta de que eu nem sabia o nome dele. Procurei no diário de classe e soube que se chamava Lúcio – Lúcio Rodrigues Barbosa. Achei o endereço.
Longe, um dos últimos casebres do bairro. Fui lá, uma tarde. O rapaz tinha partido no dia anterior para casa de um tio, no sul do Pará.
-É, professora, meu tio não aguentou as gozações da mininada. Eu tentei fazê ele continuá, mas não teve jeito. Ele tava chateado demais. Bosta de vida! Eu devia di tê ficado na fazenda coa famia. Na cidade nóis não tem veis. Nóis fala tudo errado.
Inexperiente, confusa, sem saber o que dizer. Engoli em seco e me despedi.

O episódio ocorrera há dezessete anos e tinha caído em total esquecimento, ao menos de minha parte.
Uma tarde, um povoado à beira da Belém-Brasília, eu ia pegar o ônibus, quando alguém me chamou.
Olhei e vi, acenando para mim, um rapaz pobremente vestido, magro, com aparência doentia.
-O que é, moço?
-A senhora não se lembra de mim, fessora?
Olhei para ele, dei tratos à bola. Reconstitui num momento meus longos anos de sacerdócio, digo de magistério. Tudo escuro.
-Não me lembro não, moço. Você me conhece? De onde? Foi meu aluno? Como se chama?
Para tantas perguntas, uma resposta lacônica:
-Eu sou “Nóis mudemo”, lembra?
Comecei a tremer.
-Sim, moço. Agora lembro. Como era mesmo o seu nome?
-Lúcio – Lúcio Rodrigues Barbosa.
- 0 que aconteceu? Ah! Fessora! É mais fácil dizê o que não aconteceu. Comi o pão que o diabo amasso. E êta diabo bom de padaria! Fui garimpeiro. Fui boia-fria, um “gato” me arrecadou e levou num caminhão pruma fazenda no meio da mata. Lá trabaiei como escravo, passei fome, fui baleado quando conseguir fugi. Peguei tudo quando é doença. Até na cadeia já fui pará. Nóis ignorante as veis fais coisa sem querê fazê. A escola fais uma farta danada. Eu não devia tê saído daquele jeito, fessora, mais não aguentei as gozação da turma. Eu vi logo que nunca ia consegui falá direito. Ainda hoje não sei.
-Meu Deus!
Aquela revelação me virou pelo avesso. Foi demais para mim. Descontrolada, comecei a soluçar convulsivamente. Como eu podia ter sido tão burra e má? E abracei o rapaz, o que restava do rapaz que me olhava atarantado.
O ônibus buzinou com insistência.
- O rapaz afastou-me se si suavemente.
- Chora não, fessora! A senhora não tem cura.
Como? Eu não tenho culpa? Deus do céu!
Entrei no ônibus apinhado. Cem olhos eram cem flechas vingadoras apontadas para mim. O ônibus partiu. Pensei na minha sala de aula. Eu era uma assassina a caminho da guilhotina.

Hoje tenho raiva da gramática. Eu mudo, tu mudas, ele muda, nós mudamos... Super usada, mal usada, abusada, ela é uma guilhotina dentro da escola. A gramática faz gato e sapato da língua materna, a língua que a criança aprendeu com seus pais e irmãos e colegas – e se torna o terror dos alunos. Em vez de estimular e fazer crescer, comunicando, ela reprime e oprime, cobrando centenas de regrinhas estúpidas para aquela idade.
E os lúcios da vida, os milhares lúcios da periferia e do interior, barrados nas salas de aula:
“Não é assim que se diz, menino!” Como se o professor quisesse dizer: “Você está errado! Os seus pais estão errados! Seus irmãos e amigos e vizinhos estão errados! A certa sou eu! Imite-me!
Copie-me! Fale como eu! Você não seja você! Renegue suas raízes! Diminua-se ! Desfigure-se! Fique no seu lugar!
Seja uma sombra!”
E siga desarmado para o matadouro da vida...

(Fidêncio Bogo)

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Trecho do "Poema para Dois"

Poema para Dois

Enfim, chegais!
Chamados pelo amor,
o seguistes por caminhos floridos.
Segui-lo-eis ainda,
por veredas suaves,
por atalhos escarpados.
Segui-lo-eis, engrinaldados,
ou coroados de espinhos,
- porque não cabe a vós traçar o caminho do amor.


Parti, portanto,
juntos no amor!


O amor é vossa glória
e vossa humilhação.
Como a chuva de verão,
ele vos fecunda,
vos faz brotar e frondejar vistosos.
Mas para que a copa não seja apenas folhas,
o amor vos poda com a lâmina da dor,
e assim vos enflorais
e vos cobris de fruto.


O amor é doação
e renúncia.


Quando dais,
que a dádiva se solte de vossas mãos
mas também de vosso coração,
para que um dia não a queiras de volta
e não busqueis comprar com ela
uma união
cujas raízes não estão no dar,
mas em quem dá e em quem recebe.


O amor é união
e diversidade.


Sede unidos
como as cordas que vibram uníssonas
mas precisam estar separadas
para poder vibrar.
Sede como as colunas do templo
que se erguem separadas
para que juntas possam sustentá-lo.
Sede como as margens do rio,
sempre voltadas uma para outra,
contendo as mesmas águas,
levando-as para o mesmo oceano,
mas conservando-se distanciadas
para que entre elas
as águas possam fluir.


Não importa qual a nuvem
que derrama a chuva
O que importa é a água
que fecunda o solo.
Não importa qual a lâmina
que poda os ramos,
O que importa
é a seiva que matiza as flores
e redoira os frutos.
Não importa quais os dedos
que ferem as cordas.
O que importa
é a melodia que delas se desprende.
Não importa
qual a mão que ergue as colunas.
O que importa
é que elas sustentam o edifício.
Não importa
qual o rumo que as margens seguem.
O que importa
é que o rio chegue ao mar.


Vivei na mesma altura,
mas não vos niveleis.
Uni-vos profundamente,
mas não vos amarreis.
Caminhai pela mesma estrada,
mas cada qual com seus próprios pés.
Sede fiéis um ao outro,
mas cada qual não traia a si mesmo.
Carregai o fardo juntos,
mas cada qual se disponha a carregá-lo sozinho.


Vivei em dueto,
mas cada qual se prepare para o solo...
...o solo daquele dia
no qual o amor
que vos chamou
que voz conduziu
que vos fecundou
que vos podou
que vos floresceu
que vos frutificou
vos colherá como uvas maduras
espremerá o sumo de vossa existência mortal
e vos derramará
como vinho escolhido
no coração de Deus.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Amor ...

Quero ser o vento ...




80 Anos!

No dia 12 de maio de 2011, Fidêncio Bogo, meu querido pai, completou 80 anos de vida, vividos intensamente, meio sem juizo, mas com grandes realizações.

Esse poeta, meio homem meio menino, é muito amado pelos que passaram pela sua vida. A prova foram as demonstrações de carinho recebidas na sua festa de aniverário (depois postarei algumas fotos aqui).

Muito obrigada a todos que compareceram e tornaram esse um momento muito especial.

Madianita